6 de setembro de 2014
Foi publicado ontem pelo Tribunal Regional Federal da 1ª região um acórdão grande importância para todas as associações de proteção automotiva e para os milhares de cidadãos optantes pela modalidade; decisão esta que pode representar um marco decisivo no embate jurídico travado entre as entidades e as seguradoras, estas representadas pela SUSEP.
Em decisão inédita, proferida com brilhantismo pelos nobres desembargadores nos autos da ação civil pública ajuizada pela SUSEP em face da associação, o Tribunal Federal decidiu de forma unânime pela improcedência dos pedidos formulados pela SUSEP, decretando a legalidade das atividades da associação de proteção automotiva, sendo acatadas na decisão todas as razões recursais apresentadas pela entidade, representada no processo pelo escritório Assis Videira Consultoria e Advocacia.
Em primeira instância, a sentença proferida pelo Juiz Federal havia decretado o encerramento das atividades da associação, considerando sua atuação no mercado irregular.
Diante do recurso de apelação interposto ao Tribunal Federal pelo escritório Assis Videira Consultoria e Advocacia, os desembargadores reformaram a sentença por unanimidade, decretando a legalidade das atividades da associação no mercado. Ainda, decretaram expressamente a inexistência de crime na principal atividade desenvolvida pela entidade, qual seja, a proteção automotiva.
Importante salientar que esta é a primeira decisão de mérito tratando do embate entre a SUSEP e as associações de proteção automotiva proferida por Tribunais Federais, em todo o País.
Trata-se de uma decisão sem precedentes, que certamente será um divisor de águas na batalha jurídica travada entre a SUSEP e as associações.
No acórdão, os desembargadores afirmaram:
“Verifica-se, assim, a possibilidade da instituição de uma associação sem fins lucrativos, voltada para ajuda mútua de seus associados, com repartição de custos e benefícios entre seus participantes, mediante rateio, e caracterizada pela autogestão, a qual não se confunde com o seguro capitalista oferecido pelas seguradoras convencionais, sujeitas à legislação específica.”
Ainda, trataram sobre as efetivas distinções entre as atividades:
“Neste aspecto, observa-se que a preocupação da SUSEP, com a falta de garantia dos consumidores de que seus riscos serão efetivamente cobertos, não se sustenta. O mecanismo do contrato plurilateral envolve o conhecimento das condições do rateio das despesas verificadas entre os associados, como claramente explicitado no regulamento da associação (fls. 65/72). E estão todos cientes de que, quanto menor o número de associados, maiores serão as despesas a serem custeadas por todos, e vice-versa.
A ideia, evidentemente, é dividir os prejuízos com outras pessoas na mesma situação, em sistemática diversa daquela implementada pelas companhias seguradoras, em que o contrato celebrado entre segurado e segurador efetivamente obriga o segurador “a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos determinados” (art. 757, caput, do CPC).
Por fim, sustentaram a legalidade das atividades da entidade:
“Inviável, destarte, afirmar a ilegalidade de toda e qualquer associação de pessoas unidas com o objetivo de ratear despesas diversas, apenas para assegurar a lucratividade e a competitividade das companhias seguradoras convencionais, em evidente cerceamento da autonomia da vontade e da liberdade de associação.
Verifica-se, assim, a inexistência de qualquer ilegalidade na atuação da associação Ré, que não efetua contratos de seguro na modalidade típica albergada pelo Código Civil e pela legislação específica, como explicitado acima.”
Segue abaixo a ementa da decisão.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SUSEP. ASSOCIAÇÃO. PROTEÇÃO AUTOMOTIVA. ILEGALIDADE. INEXISTÊNCIA.
A despeito das atribuições legais da SUSEP para a fiscalização das operações de seguro e afins (Decreto-lei n.º 73/66), não se verifica no caso, a negociação ilegal de seguros por associação sem fins lucrativos instituída com o fim de promover proteção automotiva a seus associados. Apesar das semelhanças com o contrato de seguro automobilístico típico, há inegáveis diferenças, como o rateio de despesas entre os associados, apuradas no mês anterior, e proporcional às quotas existentes, com limite máximo de valor a ser indenizado. Hipótese de contrato pluralista, em grupo restrito de ajuda mútua, caracterizado pela autogestão (Enunciado n.º 185 da III Jornada de Direito Civil), em que não há a figura do segurado e do segurador, nem garantia de risco coberto, mas rateio de prejuízos efetivamente caracterizados. Eventual prática de crime (art. 121 do DL n.º 73/66) há de ser aferida na via própria, mas não há qualquer ilegalidade na simples associação para rateio de prejuízos. Apelação provida. Sentença reformada.